quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Pessoas que não existem

Caminhavam cabisbaixas com seus sorrisos tímidos presos entre os lábios, enquanto os olhos levemente puxados e negros cuidavam dos carros para que pudessem atravessar a rua. Ali, naquele país de oportunidades, aquelas duas jovens já se sentiam em casa. Seguiam pelas bandas do Bom Retiro, onde nas proximidades da Rua José Paulino - conhecido centro comercial - trabalham número expressivo de conterrâneos.

Os cabelos lisos, negros, cumpridos e grossos esvoaçavam ao vento, mesmo que estivessem presos. Elas pareciam imitar o jeito de vestir uma da outra, assim como fazem muitos grupos de jovens. Tinham traços parecidos, mas eram tão diferentes. Carregavam uma beleza peculiar dos de seu País, que poucos por aqui sabem enxergar.

Estavam, finalmente, prontas para atravessar a rua. Desceram da calçada e deram o primeiro passo em direção ao outro lado, quando, um carro desses populares, negro e rebaixado, dirigido por outro jovem - esse tipicamente brasileiro de classe média-, com som ligado e alta velocidade disparou: “Ôh, Bolíviaaa!”.

O grito rápido e forte ecoou pelos ouvidos das garotas, que finalmente mostraram os dentes mal-cuidados em um sorriso sincero. Não compreenderam o sentido do que o garoto dissera e talvez nunca consigam. Melhor assim. Ou não. Continuarão trabalhando na informalidade, em subempregos e casando entre si, sem que saibam como são vistas pelos nascidos naquele país que as “acolheu”. Permanecerão chegando cada vez mais a São Paulo e se tornarão ainda mais invisíveis. As ‘bolívias’ jamais entenderão a pequena cabeça do rapaz que tentou em vão ofendê-las. E o ‘brasil’ continuará a desconhecê-las, a aumentar o som e a acelerar ainda mais.

Entre Aspas: Em nenhum lugar existe tempo algum. Mário Peixoto

2 comentários:

Caroline Castro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Caroline Castro disse...

Gui, ótimo texto, tá cada dia melhor, amore.
Mas gostei mesmo do post anterior. A nossa paz a gente constrói, embora às vezes as circunstâncias insistam em trazer de volta nossos tormentos. Mas no fundo é só pra gente aprender a lidar com eles. Cuida da sua paz pq ela ajuda a garantir a minha.

Bjos!